Depoimentos de Testemunhas de Jeová

"Não há saída honrosa dessa religião!"

Leonard Chretien, autor do livro "Por dentro da Torre de Vigia" (em inglês)

        Desde a criação da mail list "Testemunhas", bem como durante o período de desenvolvimento desta HP, temos tido contatos enriquecedores com  "Testemunhas (ou ex-Testemunhas) de Jeová". A partir desse contato, diversas delas sentiram-se motivadas a relatarem sua experiência enquanto membros deste movimento religioso. Os relatos dramáticos feitos por inúmeras pessoas parece contradizer uma tese bastante difundida entre as Testemunhas: a de que sua comunidade constitui um autêntico 'paraíso espiritual' - uma espécie de antecipação de um 'Novo Mundo', habitado por um 'povo escolhido',  onde as transgressões humanas tem baixíssima incidência. Deveras, a edição de 15 de março de 1986 da revista A Sentinela afirma que apenas entre as Testemunhas de Jeová pode-se usufruir tal condição paradisíaca. A despeito de tal otimismo, até hoje não se pôde, à base de dados estatísticos confiáveis, aferir a 'moralidade' de qualquer grupo religioso como superior ou inferior àquela professa pelos  demais. Ainda assim, a maioria das Testemunhas acha-se disposta a crer piamente na tese acima citada, destacando-a como um 'sinal distintivo' dos verdadeiros cristãos nos tempos hodiernos. É fato que dentro da comunidade das Testemunhas poderiam ser colhidos inúmeros depoimentos de júbilo - ex-drogados e ex-criminosos reabilitados ou pessoas que estiveram à beira do suicídio e que agora encontraram na nova fé uma motivação para viver. Todavia, também é fato que tal testemunho não é exclusividade de uma religião em particular, pois  dezenas de outras denominações religiosas - evangélicos, católicos carismáticos, espíritas etc. - também reivindicam 'testemunhos de libertação'. Basta que alguém entre em um templo ou assista a um programa de gospel na TV e poderá ouvir emocionados relatos de conversão. E não há razão plausível para duvidar da sinceridade daqueles que assim se expressam. Assim sendo, o que merece ser considerado em cada caso é o preço a ser pago por tal realização espiritual - muitos, mais tarde, descobriram ser alto demais. Por outro lado, raramente as Testemunhas de Jeová tomam conhecimento das reais razões pelas quais uma parcela de seus membros tem desertado do movimento - as alegações desses últimos não são levadas ao conhecimento dos demais.  As Testemunhas preferem presumir que sempre são desonrosas as motivações dos que abandonam suas fileiras. Parte da história permanece, assim, na obscuridade. As lacunas deixadas, por sua vez, não raramente dão margem à maledicência alheia, a qual finda por lançar desonra sobre a reputação daqueles que saem. Um fator adicional deve ser levado em conta: o público em geral, que não tem conhecimento do tratamento dispensado pela instituição aos dissidentes. É, pois, em nome da transparência em assuntos religiosos e da liberdade de expressão que aqui concedemos espaço aos depoimentos dessas pessoas.  Deixemos que elas mesmas falem. A busca da verdade não tolera a supressão de evidências. Cremos sinceramente que os relatos aqui contidos ajudarão o leitor a conhecer os bastidores dessa comunidade religiosa, familiarizando-o com os reais problemas com que cada Testemunha de Jeová se confronta em seu cotidiano. Só assim poderemos avaliar se os benefícios prometidos valem o preço pago por eles...

(Os nomes dos depoentes ou de pessoas por eles citadas foram omitidos, de modo a assegurar-lhes privacidade e, ao mesmo tempo,  resguardá-los contra represálias religiosas ou judiciais. Abriu-se exceção apenas por permissão expressa do depoente.)

 

Índice

 

  1. "Vida e Morte no Poder da Língua"

  2. Conformidade de Grupo?

  3. Frieza 'Cristã'

  4. 'Matrix'

  5. A Justiça dos Homens

  6. Rompendo os Grilhões

  7. Desmistificando Betel

  8. Tempos de Descobertas

 

 

 

"Vida e Morte no Poder da Língua"

Início

R., Brasil, 29/9/1999 

 

     Já se passaram cerca de 12 anos que esta história aconteceu. Eu tinha entre meus 16 e 17 anos. Era uma cristã embora jovem, mas com o fervor de   uma consciência treinada  no trabalho de pioneira. Resolvi escolher um jovem, filho de um ancião, para ser o meu primeiro namorado e poder servir ao meu lado e lealmente a meu amado Deus. Me apaixonei arduamente por este irmão, a ponto de esquecer barreiras sociais, e até intelectuais. Ao enfrentar meus pais, tive forças para ultrapassar qualquer outro empecilho e demonstrar  meu sincero amor por este irmão. Porém, não imaginava que iria passar também por uma prova de fé tão severa. Em face aos anos em que ficamos juntos, comecei a enfrentar o problema que, em algum momento, vem a todos os jovens namorados. As nossas intimidades, que insistiam em aumentar, me levaram a procurar ajuda de meus anciões. O que não me deixava satisfeita é que nunca chamaram meu noivo para poder ter uma conversa com ele e também ajudá-lo. Minhas visitas eram freqüentes. O nosso relacionamento estava muito abalado. Já não sabia até que ponto ele realmente me amava. Cheguei a me convencer de que ele estaria comigo apenas até o momento em que eu cedesse. Foi um longo tempo de desgaste emocional e longas noites de consciência abalada. O pior é que ninguém se mostrou interessado em nos ajudar. Talvez por ele ser filho de um ancião e também por estarmos em um tempo bem próximo ao nosso casamento. Mas isso não me protegeu das seqüelas. Em uma noite, cerca de um mês antes de nosso casamento, em minha casa,  meu noivo me acordou em longos beijos e intimidades que me levaram, no dia seguinte, a imaginar que tinha cometido o maior de todos os pecados. Sem ele saber me dirigi a um ancião e lhe contei o que tinha acontecido. A verdade é que nem eu mesmo sabia ao certo o que tínhamos feito.

 

     Chegou o dia da minha comissão judicativa. Esta ocorreu na presença de um Superintendente de Distrito e de mais três anciões maduros. A situação não era nada agradável, meu noivo não estava nem um pouco satisfeito com minha atitude, seu pai também me olhava com ar de desagrado. Até que no momento da reunião - a sós com estes irmãos - o peso foi maior do que imaginava. As perguntas eram embaraçadoras, tudo me levava a total inutilidade, me sentia o pior dos seres humanos. A vergonha era terrível. Confirmei tudo, afinal estava me sentido muito mal por ter errado. Mas mesmo assim, acreditava que Jeová ainda me amava e estava disposta a fazer qualquer coisa para agradá-Lo. Não sei o que se passou na comissão do meu noivo, só sei que ele não estava nada satisfeito com aquela situação e me condenava muito por isto.

 

     A decisão era para ter sido rápida, porém um fato novo acontecera - o que era para ter sido guardado conosco, estava no conhecimento de meu irmão carnal e sua esposa. Não é difícil imaginar o que se sucedeu. Sua esposa fez questão de relatar "para apenas alguns irmãos", membros de sua família o que me acontecera, afinal era um bom "noticiário". Não satisfeitos, ainda 'rechearam' o relato de "lindas" estórias de traições e de uniões com outros homens que davam lindos dotes por noites vividas comigo. Fizeram ainda o 'favor' de dizer aos meus pais o que bem quiseram e de levar o caso "cuidadosamente a apenas mais alguns amigos". A situação terminou quando minha mãe me expulsou de casa. Meu irmão e sua esposa não falavam mais comigo, meu noivado estava acabado e, por cima, ainda descobri que o causador de tudo isto era um 'adorável e manso'  irmão, que não participara da comissão, mas que, por ligações a um membro, tomou conhecimento do assunto da forma que melhor lhe satisfez e, a partir daí, resolveu tomar as dores de meu irmão carnal e fazer julgamento público de mim.

 

     A punição sem dúvida alguma não agradou a todos, afinal eu era a nova 'Jezabel', tinha de ser jogada aos cães. O fato de ter sido apenas repreendida em público causou grande repercussão na congregação. Não se satisfizeram até o dia de hoje com tal ato de misericórdia. Não se conformaram mais ainda com o fato de meu noivo ter sido desassociado. Me senti o próprio pecado. Não sabia a quem recorrer. Não tinha mais noivo, nem irmão, nem mãe, nem congregação. Todos 'sabiam', e da forma deles, o que eu supostamente fiz. Surpreendia-me com cada novidade sobre atos cometidos por mim que as pessoas espalhavam. Por onde passava, os cochichos me seguiam: "Lá vai ela, a espertalhona que enganou o noivo, desassociou-o, enganou a todos com esta cara de santa. Há, ainda tem uma 'cobertura' na praia com um homem mais velho. Ele que paga suas lindas roupas. Como ela é cínica!".

 

     Eu só tinha 17 anos, nunca tive outra experiência amorosa, acreditava em meus irmãos, acreditava na congregação, acreditava na confissão de meus pecados aos designados por Jeová como instrumento dele de ajuda. Até hoje não sei onde errei tão severamente. Será que foi por ter procurado ajuda de meus irmãos? Será que errei quando acreditei que isto fortaleceria minha união com meu amado noivo e com meu Deus? Tudo estava acabado para mim, minha juventude, minha pureza, minha lealdade a meus princípios, estava exposta a quem quisesse jogar a primeira pedra. Até hoje, neste momento, ainda sinto meu coração apertar, ainda choro aquelas lágrimas que nunca deixaram meu rosto. Ainda sinto os olhares, os falatórios, o suposto amor que perdi. Ainda sinto a minha vida quase acabada em um gole de veneno. Ainda sinto as mãos daquele amigo, hoje marido, que me impediu de concretizar tal ato. Embora não saiba se realmente era para ter acontecido assim, acho que  deveria tudo ter acabado ali, nada deveria ter continuado. Nem mesmo a vida...

 

 

Conformidade de Grupo?

Início

W., Brasil, 5/7/2000 

 

Minha experiência pessoal 

 

     Desiludido, em meio a devaneios e com o coração em pedaços por não ter sido correspondido com uma pessoa a quem eu tanto amava...

     Assim era minha situação quando fui “interceptado” por duas pessoas na porta de minha casa que  começaram a  me falar de um futuro promissor para todas as pessoas puras e sinceras de coração. Eu estava inconformado com minha situação sentimental naquela época , e, por isso, aceitei um “estudo” com aquelas pessoas que se identificavam como “Testemunhas de Jeová”.     

     O inicio foi um tanto duro, pois meus pais eram católicos e não aceitavam a idéia de eu mudar de  religião. Meu pai fez uma tentativa inicial de me desestimular a continuar aquele estudo, me mostrando um artigo que falava sobre “Russel” em uma revista mensal que ele assinava, denominada “Catolicismo”. As graves acusações feitas naquele artigo, não surgiram muito efeito sobre mim. Porque? Porque eu me recusava a acreditar que aquelas pessoas amigáveis, com um sorriso constante pudessem ser representantes de uma religião enganadora... ainda mais porque estavam constantemente a me confortar com palavras amigáveis acerca dos meus problemas sentimentais.  

     Comecei então a freqüentar o “Salão do Reino”. Nas primeiras vezes que fui, foi demais!!! Todas as pessoas vinham ao meu encontro para me cumprimentar e se apresentarem . Quão satisfeito fiquei! Cheguei a conclusão de que ali as pessoas eram amorosas e atenciosas umas com as outras... 'finalmente havia encontrado minha verdadeira família', pensei...     

     Os estudos comigo continuavam. Eu percebia um ligeiro excesso de atenção por parte dos meus instrutores, pois eles eram pontuais, e não faltavam a um estudo sequer. Estranhei aquela atitude, pois jamais havia encontrado pessoas tão atenciosas em relação a minha pessoa daquela forma. Ah, se eu soubesse desde aquela época que a causa daquela atenção era um tal  de “relatório de serviço de campo”...     

     O fato é que eu me senti amado por aquelas pessoas. Meus pais e amigos do mundo já não me criticavam mais frente a frente, mas somente por terceiros. Eu comecei a me sentir afastado tanto de meus amigos como de meus familiares, mas ao mesmo tempo tentava explicar a eles o quão amorosas eram as Testemunhas de Jeová e cheguei até a  pensar que poderia, um dia, levá-los para lá também. O tempo foi passando e, sem que eu percebesse, fui me envolvendo mais e mais com as Testemunhas de Jeová no que se refere ao companheirismo.  

     Certa vez, uma pessoa se aproximou de mim e me mostrou o que estava escrito em João 1:1. Foi a primeira vez que tomei um “pequeno susto” sobre a doutrina em que eu estava. Corri com aquela passagem ao meu instrutor (achando que ele não soubesse). A explicação que me foi dada, todos aqui já conhecem. 'Maravilha!', pensei! 'As TJ são realmente pessoas instruídas e cultas... conhecem até termos em grego e hebraico !!!' Então reforcei mais ainda minha fé naquela organização.  

     O tempo foi passando até que, depois de um ano de estudo, foi me revelado a existência e o real significado do “relatório de serviço de campo”... é claro que eu não iria ficar uma eternidade sem saber!..

     Isso ocorreu em um dia quando eu estava a estudar com meu “amoroso e atencioso” instrutor . Ali, em meio ao estudo, chegou uma outra TJ (que já tinha se tornado um grande amigo meu) em minha casa e fez uma piadinha com meu instrutor. Ele disse : “XXXXX, já chega de 'fazer horas' com o W. !!! Vamos jogar uma bolinha agora!!!”  

     “Fazer o quê???” ,indaguei.  

     “Ué, até hoje seu instrutor não lhe disse o que é o relatório de serviço de campo? Ainda mais agora que você está prestes à se tornar um publicador não batizado?”, respondeu meu amigo.  

     Então fiquei ali conversando de 10 ou 15 minutos. Soube então qual era o real significado dos “relatórios". Fiquei com uma “jaca entalada na garganta” ao saber então que desde o início meu instrutor não me amava e se interessava por mim “exatamente da maneira” que eu pensava, mas sim, que havia um outro pequeno interesse por trás de todas aquelas visitas...  

     Senti-me muito mal, mas já havia, com o tempo, aprendido a gostar daquelas pessoas  e fiquei sem jeito de sequer dar uma “ralada” em meu instrutor por não ter me dito desde o inicio que ele dava “satisfação” aos outros das horas que estudava comigo. Pela primeira vez havia descoberto algo de “estranho” na organização, pensei. Meio já envolvido com aquela turma, me tornei “publicador não batizado”, onde ao mesmo tempo conheci uma  pessoa que viria a ser minha noiva no futuro. Passei seis meses “anestesiado” com a organização e o serviço de campo. Eu sentia satisfação em bater de porta em porta e “vencer objeções” com os mais incautos. Eu achava que Jeová se orgulhava da minha pessoa como defensor de sua palavra - a verdade. Meus discursos eram excepcionais. Meus irmãos diziam que logo haveria mais um ancião naquela congregação.  

     Até que, num determinado dia, depois de meu batismo, no serviço de campo, comecei a argumentar com um morador sobre a questão do sangue. O homem, nada simplório, não se entregou aos meus argumentos (será que eram meus mesmo?) acerca do sangue. Ao contrário disso, ele sem Bíblia, sem nada, simplesmente com palavras mansas,  começou a questionar a posição das TJ em relação ao sangue e o que Deus pensava de tal assunto. Pela primeira vez na minha comecei a desconfiar que poderia haver algo questionável na organização.  

     Naquele final de semana, recolhi-me em meu quarto em intensa oração, pedindo a Jeová que me mostrasse a verdade, ou que me livrasse das influencias de Satanás, se fosse o caso. Comecei a analisar tal doutrina mais a fundo, e cheguei a conclusão de que realmente poderia ter algum "furo", visto que havia a mão de homens no meio. Cheguei então à conclusão que a doutrina da abstinência do sangue, segundo as TJ, estava equivocada. Eu nem pensava em discutir isso com minha noiva pois a mesma, bem como sua família, eram extremamente “teocráticos” . Qualquer assunto fora dos padrões da organização eram considerados 'heresias'. Mas, mesmo assim, não deixei passar a questão do sangue em branco. Continuava estudando.  

     Eu nem sonhava que existiam “apóstatas da verdade” e, portanto, eu não tinha referências, a não ser a própria Bíblia. Então, na minha condição de “apóstata amador”, escrevi uma carta anônima ao Corpo Governante sobre o sangue. Tratava-se de um diálogo fictício entre um servo ministerial e um ancião (veja a reprodução do mesmo em letras azuis no fim desse texto).

     A esta altura, eu já havia notado que meus irmãos não eram tão “cultos” como eu pensava no início, mas que seus argumentos eram repetitivos e mecânicos, baseados nos livros tais como o “Raciocínios”.  

     Eu achava que Jeová havia me escolhido para produzir uma reforma na organização... achava que estava sozinho no mundo. Pensava que os membros do Corpo Governante (CG) não haviam considerado a minha linha de raciocínio a respeito do sangue e que, portanto, poderiam cair em si  e anular esse dogma anti-bíblico. Cheguei até mesmo a pensar que eu iria fazer parte dos 144.000 por ter sido um “canal especial” usado por Jeová para corrigir alguns erros de sua organização !!!  

     Mandei várias vezes essa mesma carta e...nada!!!! Ao contrário disso, vinham orientações do CG que eram passadas aos anciãos em discurso no sentido de tomar cuidado com os apóstatas, pois o cerco estava se apertando! Eu fiquei muito triste e me desanimei, pois me sentia “um” contra “milhões”. Depois de ter já marcado a data de meu casamento, continuei em meus estudos usando apenas a Bíblia , pois como disse, não tinha nenhum outro referencial, a não ser ela. Então, descobri outra coisa estranha... tratava-se do retorno de Cristo em 1914, segundo as TJ. Lendo o capitulo 24 de Mateus, notei que Cristo anunciou que haveria guerras, fome, pestilências, falsos Cristos, falsos profetas, terremotos, e DEPOIS; somente ENTÃO é que veríamos Cristo descendo nas nuvens com poder e grande glória. As TJ pregam tal coisa de forma invertida, ou seja, Cristo voltou em 1914 e DEPOIS tais coisas como terremotos e aparecimentos de falsos Cristos começaram a acontecer. 'E agora?', pensei.

     Pela primeira vez em minha vida estava me sentido sozinho, apesar de tantos irmãos à minha volta.  

     No que diz respeito ao serviço de campo, comecei a notar alguns comentários  estranhos por parte de meus irmãos. Já não eram mais “Vamos pregar e alertar as pessoas do final dos tempos”, mas sim “minhas horas estão fracas esse mês, preciso te acompanhar em teus estudos”, ou ainda “Vamos trabalhar mais 15 minutos, pois assim completaremos  duas horas de registro hoje.” Comecei a me sentir mal com essas coisas. Quando saía no campo, sabia que seria obrigado a defender as doutrinas relativas a  1914 ou a questão do sangue, mesmo sentindo no meu interior que estavam erradas, ou seja, eu seria obrigado a enganar as pessoas. 

     Até que, um dia, comecei a acessar a Internet... aí, descobri que não estava mais sozinho e que existiam muitas pessoas que pensavam como eu. Posso dizer que “a gota d’água” foi quando li um artigo na página do “Irmão brasileiro”  dizendo que o CG não tinha Jesus Cristo como mediador legal entre Deus e os homens. Ali ele citou algumas “Sentinelas” como referencias. Referências essas  que foram prontamente investigadas e confirmadas por mim em pesquisas.  

     Lembro-me até hoje daquele dia. Meu estômago começou a 'embrulhar ' e eu nem mesmo consegui jantar... sentia uma  indescritível  vergonha de Jesus, com o qual eu tentava incansavelmente argumentar : “Meu Senhor, eu não sabia que eles ensinavam isso... perdoe-me!”

     Meu instrutor, que era o ancião residente da congregação, também era o pedreiro que estava construindo a minha casa; o meu futuro lar como homem casado.  No outro dia (sábado) fui bem cedo até a obra e o chamei para dialogarmos. Ali, expus tudo o que havia descoberto na Net, bem como minha idéias sobre a organização. É claro que eu já esperava que ele não conseguiria refutar aquelas matérias... Primeiro, porque eram verdades, e, segundo, porque não lhe foi ensinado pela organização a se defender de tais matérias.  

     Depois de um extenso  diálogo, meu instrutor deu um profundo suspiro e me disse:

     “W., mesmo que me mostrassem que 80% dos ensinamentos da organização são falsos e apenas 20% são verdadeiros, eu  ainda assim continuaria na organização”.  

     O diálogo parou ali e fingi concordar com ele.  

     Uma vez que eu já havia mostrado que tinha entrado em contato com os apóstatas, não seria boa idéia uma discussão. Ao invés disso, disfarcei. Eu disse a ele que iria queimar todo aquele material “apóstata” e que nunca mais tocaria no assunto.

     Mas eu já estava em um grande conflito espiritual. Não sabia com quem conversar, e então decidi trocar umas idéias com outro  TJ, amigo mais intimo meu. Esse amigo me surpreendeu, pois ele concordou em grande parte comigo sobre os erros da organização. Em meio ao nosso diálogo, eu perguntei o que ele achava de pregar aqueles ensinamentos às pessoas de porta em porta mesmo sabendo que estavam errados. Sua resposta:  

     “W., eu transmito às pessoas aquilo que o CG me pede para transmitir.... agora, caberá a cada morador interpretar se aqueles ensinamentos são corretos ou não”.  

     “Sem comentários”, pensei comigo.  

     Nesse momento, parei de dialogar com ele e vim embora para minha casa. Eu já havia decidido em meu coração que não ficaria mais naquela organização falsa e opressiva. Mas havia pelo menos uma pessoa que eu queria tirar de lá - MINHA NOIVA. Primeiro, porque eu a amava muito e, segundo,  porque nosso casamento já estava praticamente todo organizado. Convites prontos, festa paga, enxoval pronto, vestido e terno alugados, aluguel do clube pago, etc e tal...  

     No outro dia, fui até a casa dela e comecei uma conversa bem sutil em termos apóstatas. Esse diálogo “sutil”, durou mais ou menos uma semana. A reação negativa que ela teve foi cerca de dez vezes maior do que eu esperava. Resultado: nós terminamos e eu me dissociei através de uma carta entregue por minha mãe ao meu instrutor e “mestre de obras” da minha casa. Joguei tudo pelo ares, pois, em minha mente, somente vinham duas passagens bíblicas, que eram: 

1- “Todo aquele que preferir seu pai, seus amigos (ou sua noiva) ... ao invés de mim, não é digno de mim””

2- Apocalipse 21:8: “mas enquanto aos covardes, ...assassinos, idólatras... terão seu quinhão no lago que queima como fogo e enxofre.”

  Depois de dissociado, realmente foi difícil superar tal trauma!  

     O principal sentimento ruim era a perda de minha noiva, mas havia também os meus irmãos de fé. Eu saia às ruas temendo encontrar a todo momento meus ex-irmãos  (amigos) e os verem virando seu rosto para mim. Parece que ficar em casa era a melhor coisa a ser feita, pois tinha medo de encarar a realidade.

     REALIDADE? Qual era ela? Era o fato de eu ter saído de uma doutrina enganosa. E foi baseado nesse firme pensamento, juntamente com a ajuda de Deus que consegui superar essa difícil fase da minha vida. Sinto ainda alguns “efeitos colaterais” , mas já estão em  menor intensidade. O tempo, bem como a fé em Deus  são os melhores remédios que existem para esses casos.

 

     *A seguir, o texto que fora repetidas vezes enviados à sede da Sociedade Torre de Vigia:

Dialogo entre um ancião e um Servo Ministerial  

  S- Instrutor, estou passando muita dificuldade no campo no que se refere ao sangue. Por mais que eu explique a questão do sangue, mostrando passagens bíblicas as pessoas, ainda assim não concordam comigo e terminam por me expulsar de suas casas.  

A-   Meu amado, seja forte! A Bíblia nos diz que seriamos odiados e repudiados pelas pessoas do sistema. Agora, quanto ao sangue, infelizmente as pessoas do mundo estão certa - nosso conceito sobre o sangue está errado!  

S- O quê ?? O que está dizendo, irmão? Não sabe que isso é apostasia?  

A-    Sei perfeitamente o que é apostasia, irmão! Mas deixe-me ao menos explicar porque penso assim: primeiro, imagine o que Jesus faria se uma pessoa estivesse morrendo na sua frente por falta de sangue e só houvesse um frasco de sangue ao lado dele ao invés de uma solução salina. Ele permitiria a morte daquela pessoa? Ademais a Bíblia diz em João 15:12-13 que ninguém tem maior amor do que aquele que entrega a sua ALMA em favor de seus amigos. Você sabe onde está a nossa alma para que a entreguemos em favor de nossos amigos?  

S- Não!  

A-    Levítico 17:11-14 nos diz que a Alma da carne está no sangue... a alma de todo o tipo de carne é seu sangue pela alma nele. Logo, daríamos o nosso sangue em favor de nossos amigos. A Bíblia ainda nos diz que o amor cobre uma multidão de pecados. Mesmo que tomar sangue fosse pecado, tal pecado poderia ser encoberto pelo ato de amor que uma pessoa tenha feito no sentido de salvar a vida de seu próximo por doar sangue.  

S- Mas, a Bíblia nos diz para nos abstermos de sangue, irmão!  

A-    Sim, ela nos diz para abstermos de sangue no sentido de ALIMENTO. Observe as passagens sobre sangue em Lev. e Gên - você irá encontrar somente frases do tipo “Não deveis COMER...”, e outras do mesmo sentido.  

S- Mas, no nosso livro “Raciocínios” se diz que uma transfusão é o mesmo que comer sangue, irmão! Assim ele diz: “ Será que alguém que jamais pusesse sangue em sua boca mas que o aceitasse por meio de transfusão, não estaria obedecendo a ordem bíblica de persistir em abster-se de sangue?”

A-    Então eu lhe pergunto: Uma TJ que necessita urgentemente de transfusão, escaparia com vida se BEBESSE solução de Ringer ou dextrano, ao invés de injetá-las nas veias?  

S-    Claro que não! 

A-    Então, transfundir não é o mesmo que comer/beber. No caso do sangue, se o bebermos, ele entrara no nosso organismo como alimento, onde será digerido pelos órgãos da digestão. Se o sangue entrar no nosso organismo através das veias, ele não será considerado como um alimento, mas sim como um VEÍCULO de levar o alimento e o oxigênio para o nosso corpo! É bem diferente!  

S- Realmente, se esta linha de raciocínio, ao meu ver muito lógica e baseada na Bíblia for correta, então porque os irmãos não a consideram no sentido de corrigir tal princípio?  

A-    Imagine então se a sociedade lançar um artigo liberando o uso do sangue por parte dos irmãos. O que você acha que iria acontecer? Imagine a quantidade de irmãos que já perderam seus parentes por seguir tal princípio! Se o uso do sangue agora for liberado, não iria causar-lhes grande tristeza ou até indignação?  Realmente o CG deveria ser bastante humilde e corajoso a ponto de enfrentar todo o tipo de reações negativas que poderiam surgir! Reações essas dos irmãos, e também das pessoas do mundo.  

S- Podemos fazer algo a respeito?  

A-    Deixemos tudo nas mãos de Jeová . Ele proverá a melhor saída!

 

 

Frieza 'Cristã'

Início

M., Brasil, 3/8/1999 

 

 

     ...Foram cerca de 26 anos de vida dedicados a essa organização.  Imagine olhar para trás e ver que, de fato, não fez absolutamente nenhum amigo. Ninguém que se interessasse genuinamente por você. Ninguém que lhe fizesse uma visita, exceto aquelas que, com tanta cerimônia, precisavam ser "marcadas"...tinham hora para começar e hora para terminar. Nunca uma visita espontânea, como aquelas que, durante meu  “ministério”, fazia aos irmãos e irmãs. Por que tudo tinha que ser assim? Era inevitável a comparação com uma grande empresa. Nossos encarregados de setor, "os anciãos" vigiavam tudo o que fazíamos ou deixávamos de fazer, e nossa espiritualidade era medida ao passo que "puxávamos o saco" deles (desculpe-me pela a expressão)... e confesso que eu mesmo fiz isso, porque se não fizesse, não os agradasse, não os respeitasse, não lhes obedecesse, dificilmente a gente teria chance de subir na organização. Vez por outra, por um problema de doença que tivesse ou por depressão, eu talvez não fosse ou me afastasse por algum tempo. Assim que me reabilitava, tinha que ficar agüentando a severidade de um ancião que me colocava numa espécie de geladeira, achando que talvez assim estivesse me "ajudando". Não sei porque a gente acaba dando valor a essas  coisas... a gente gasta do nosso tempo, quando poderíamos estar fazendo tantas coisas e quer, de todas as formas, "ler uma Sentinela", "fazer uma oração", "fazer uma demonstração". 

     Lembro-me de uma ocasião, depois de ter passado um período difícil de depressão, ficar seis meses sem receber uma designação para demonstrações na reunião de serviço. Lembro-me de ter rasgado o “Ministério do Reino”, de tão aborrecido que eu fiquei... Por que damos tanta importância a essas coisas? Fazem-nos crer que são verdadeiros "privilégios". É Engraçado que aqueles que entram na organização e "não pisam na bola" com os encarregados, em dois anos chegam ao cargo de ancião..."se fizerem muitas horas, se respeitarem (leia-se "puxarem o saco" dos anciãos), "não faltarem no serviço" (estiverem no serviço de campo todos os sábados e domingos, estiverem nas reuniões... nunca reclamarem, nunca questionarem, afinal de contas tudo é rebeldia)... esses, em dois anos, já são anciãos! Agora, se porventura você se afastou por algum motivo, e ficou "marcado" .. passam um ano, dois, três, quatro...e você é sempre visto como aquele "fraco" que um dia "pisou na bola" e não é mais digno de nada.... e aquele que há pouco tempo estava no chamado "mundo" ... esse, sim, tem crédito! Apesar de muitas vezes ser mais versado nesse conhecimento do que muitos desses aí... mas de nada adianta... se você está na Organização e você se afastou, você sempre será marcado por isso... Tive vontade até, certa vez, de mudar-me para outro Estado e começar a estudar com as Testemunhas de Jeová, tenho plena certeza que em dois anos eu já seria ancião.... mas de que adiantaria? Satisfaria meu ego? Porque sou ótimo orador, agradar-me-ia dos elogios que recebia e isso me deixaria feliz? Não... não deveria ser essa motivação. Estaria apenas enganando a mim mesmo, se assim o fizesse. 

     Por causa da pressão da organização, desisti inclusive de tentar me aproximar de uma mulher por quem fui muito apaixonado, mas casar fora do "Senhor" (leia-se casar com alguém de fora da fortaleza da WatchTower) equivaleria a perda dos privilégios, a ser considerado como um fraco, um desprezível que cede às tentações carnais. Acabei me casando com alguém da ‘fortaleza’, para manter as aparências e isso foi ainda pior. Hoje estou aqui, separado... quero encontrar alguém. Mas fico muito triste em saber que também estou violando um mandamento bíblico no qual Cristo disse que o casamento só pode ser dissolvido por fornicação. Mas também, desculpe-me por dizer - não conheço sua opinião a respeito - mas será que Deus quer que realmente vivamos infelizes? Se uma união não dá certo, devemos sacrificar a nossa vida com alguém com quem não amamos e nem temos prazer com a vida em comum? Não sei... há horas que eu fico me perguntando por que uma mudança tão radical .... uma hora você pode ter 700 esposas, não que eu queira ser permissivo, muito pelo contrário. Outra hora, só poder ter uma. Mas eu não discordo disso. O que eu desaprovo é você viver infeliz, não ter outra solução e nunca mais poder viver com outra pessoa. Eu leio as palavras de Jesus. E a pergunta dos apóstolos em seguida - "Então, Senhor é melhor que não nos casemos". Quer dizer, se você é infeliz, se não está dando certo, "que se dane!"... Será que Jeová, Jesus... eles realmente são tirânicos a esse ponto?  Jamais você pode amar alguém  novamente?! 

     Eu jamais traí minha esposa, mesmo vivendo mal com ela. Achava que, se um dia eu quisesse encontrar alguém, deveria primeiro me separar dela, para daí, sim, encontrar alguém. E foi o que fiz. 

     Passados alguns meses da separação, em fevereiro desse ano, os anciãos - por sinal um que se dizia o meu "melhor amigo"  e outro que havia estudado a Bíblia comigo - vieram me ajudar. E fui claro, sabe? Disse que, no dia em que me casasse de novo, não gostaria que eles viessem ao meu casamento só para assinar lá fora os cartões de desassociação.  Já que era meu objetivo encontrar mesmo alguém com quem me casar, alguém para amar novamente e para quem dedicar a minha vida, não ficaria dentro da organização, só esperando o momento que fizesse isso para que eles pudessem me expulsar. Eles me disseram que eu estava agindo traiçoeiramente e que eu não pensasse que, fazendo isso, eu poderia voltar para a organização. Disseram-me que, se eu estivesse copiando (copiando?) alguém que fez isso, que não o fizesse, pois me daria mal. Disseram-me que estava sendo julgado por Jeová e que, a partir daquele momento, não teria mais vida eterna, que seria destruído para sempre. Fiquei com muita raiva e acabei por dizer que eles deveriam se retirar da minha casa. Quando ele saiu, tal qual um profeta das Escrituras Hebraicas (não há como não falar assim, Velho Testamento, depois de tantos anos na WT torna-se uma expressão esquisita)... ele levantou as mãos para o céu, e disse "que seja feita a vontade de Jeová"... o mesmo que “seja feita a vontade da Watchtower”. Não são os dois a mesma coisa? Ele disse "uma pena...uma pena....você não sabe o que está fazendo!"... e foram embora. 

     Duas semanas depois, quando estava subindo pela rua de casa, eles estavam fazendo a sua pregação, e começaram a virar os seus rostos para mim. Eu cheguei em casa e perguntei: "Mãe, alguém anunciou que eu fui dissociado?" Lembro-me de que minha mãe não havia ido na sexta-feira ao Salão do Reino. Eu disse, "estranho, porque, do jeito que eu fui tratado, era como se tivesse sido desassociado. No domingo, eu voltei a perguntar, pois ela foi à reunião logo pela manhã. E, na segunda feira, quando fui ao meu trabalho, na administração de uma loja do shopping, a minha ex-cunhada recebeu um telefonema do filho, que é servo ministerial da congregação a qual pertencia, dizendo: "Mãe, a senhora sabe que o Marcelo se dissociou?".... aí ela se virou para mim... "Você se dissociou, Marcelo?" Eu disse, "eu não sei, estou desassociado?", pois estava mesmo... Não conheço os procedimentos, mas eles deveriam ter dito que na próxima reunião iriam anunciar minha dissociação, ou algo assim, não é? Mas não o fizeram....esperava que alguém me avisasse de algo, não que eu não quisesse, pois deixei claro que queria mesmo me desligar. Mas esperava que pelos menos me avisassem, pois assim já diria para minha mãe. Foi realmente uma bênção que ela não ter ido à reunião no dia do anúncio. Isso poupou-a de muita aflição mental, que sobreviria caso ela estivesse presente àquele dia, na reunião. 

     Mas, sabe, apesar de ter ficado muito triste - afinal são anos que você dedica, horas e horas como pioneiro regular, como servo ministerial, preparando discursos, partes e se dedicando mesmo...tantas pessoas que você conheceu, com as quais conviveu... e ter que apagar tudo, como se apagasse uma parte de você, negasse um parte de sua existência... é estranho... a separação, a dissociação...sendo pai... ver sua filhinha longe .. um casamento muito infeliz .... nossa, agora mesmo estou chorando copiosamente. E ver que tudo aquilo pelo qual se dedicou ... tudo, tudo, tudo... um monte de fezes, de homens que mudam seus ensinos a todo momento, com suas luzes ‘piscantes’, que mandam e desmandam em nome de uma consciência que, se não for a deles, fazem com que você seja alijado da sua "pseudo-segurança" e atirado às trevas, como se fosse um criminoso. Pois é assim que sou visto hoje.... como um criminoso, da pior espécie ... um homem iníquo, que não é digno nem sequer de um simples ‘oi’... 

     Outro dia fui buscar a minha mãe no Salão do Reino e ela vinha  com outra irmã, minha ex-mulher e minha filhinha .. convidei-as para entrar no carro, afinal de contas estava prestando um serviço humanitário. Não é que elas não entraram? Foram apenas minha mãe e minha filhinha, enquanto elas seguiram de ônibus. E se eu fosse motorista de ônibus,  dessem sinal para que eu parasse e só depois de estarem no veículo, se dessem conta que eu estava dirigindo? Mandariam-me parar e desceriam do veículo? É... hoje a gente vê o que realmente a lavagem cerebral faz... e pensar que minha filhinha vai crescer nesse meio. 

     Ah... isso é simplesmente terrível. Mas não quero causar divisão, sabe? Jogá-la contra a mãe ou coisa parecida. Tenho um irmão que é ancião aí... um cunhado que é ancião, minha mãe que está há 35 anos nisso e nem quer ouvir falar caso eu diga qualquer coisa contra a organização. Então prefiro guardar para mim, "deixar quieto"... afinal de contas, sei o quanto as pessoas que encontrava de casa-em-casa se sentiam perturbadas na sua paz quando eu insistia em que aceitassem a Watchtower Então, que eles continuem, já me basta que todos não falam mais comigo... pelo menos meu cunhado não deixou de falar comigo, apesar de ser ancião. É, nem todo mundo concorda mesmo com isso ao pé da letra.... mas, se eu começar a dizer 1% do que a gente encontra aqui, com certeza ele não vai nem querer mais me ver, porque a programação está bem protegida contra qualquer invasão. Qualquer crítica aciona a vacina "Watchtower" ... que o chama de iníquo, rebelde, Satanás e, como tal, precisa ser exorcizado, ou melhor, evitado, "ostracismo absoluto". Eu sei de mim, sei o que é e não quero isso nunca mais. 

     Bem, acho que vou parar por aqui, acho que já escrevi muito... mas se chegou até aqui, obrigado por sua atenção.  

 

 

'Matrix'

Início

N.P., Brasil, 30/10/2000 

 

     A minha história começou quando ingenuamente aceitamos estudar a Bíblia com essas pessoas. Na verdade eu e meu marido não tínhamos nenhuma religião porque não acreditávamos nelas. Não éramos idólatras e nem tínhamos vícios..., presas perfeitas para essa seita! Enfim nos batizamos juntos e iniciamos com toda alegria e fervor nossa carreira "teocrática". Para sermos aceitos no grupo, começa com a imposição de questões que biblicamente ficariam a cargo da consciência de cada um. O comprimento da saia era de 8 dedos abaixo do joelho, questão que as "queridas" irmãs frisavam com orgulho. Esmaltes coloridos... pasmem!- eram hábitos de Jezabel, cabelos curtos ou com tonalidades marcantes eram pedras de tropeço, etc...

     Entramos no ritmo. Pareciam pessoas saídas da mesma forma. A pobre da minha filha com apenas 12 anos batizou-se. É claro com o apoio fervoroso dos pais e da congregação. Até que comecei a me interessar por livros de psicologia, e notei que eu mascarava a minha real personalidade. Foi então que aboli aquelas roupas conservadoras e passei a me vestir de forma mais despojada, sem ser deselegante ou imoral, afinal de contas, caráter não se aprende com religião. Eu já tinha cabelos razoavelmente curtos com a nuca batida, mas o escândalo se deu quando decidi cortar um pouco mais, afinal meu marido e meus filhos aprovaram e o principal: eu gosto!


     Às escondidas e sem entrar em contato com meu marido que na época já era Servo Ministerial, retiraram meus privilégios na Escola do Ministério Teocrático.

     Fiquei muitos meses sem fazer aquilo de que mais gostava: as partes na Escola. Achamos que pelo fato de haver duas congregações se reunindo juntas, as partes se tornariam mais esporádicas... Santa ingenuidade! Fomos realmente notar, quando um ancião em Necessidades Locais, frisou uma revista A Sentinela de 1963 (ou 66?) que tanto os homens como as mulheres cristãs deviam seguir o tamanho determinado do comprimento dos cabelos! Eu queria morrer de tanta  vergonha! As "queridas" irmãs começaram a passar a mão nas vastas cabeleiras para ver se o comprimento "batia" com o que fora falado na tribuna. Ao final da reunião, saí às pressas. Foi uma sensação horrível que eu nunca havia sentido em outro lugar na minha vida!

     Liguei para o ancião e perguntei em que base bíblica ele havia dito tal coisa. Tudo com educação, é claro! Ele, rispidamente, disse que eu não tinha direito de questionar-lhe e que tudo o que fora dito, era para mim.

     Reuni o material e, com muita calma e educação, provei a eles que agiram indevidamente, afinal eu não estava causando problemas a ninguém. Na época, eu tinha 5 estudos bíblicos, 3 das minhas estudantes freqüentavam as reuniões. Meu marido deixou claro que gostava de mim da maneira que eu sou, alegre, vaidosa, franca e com os cabelinhos curtos (risos). Eu queria apenas o respeito da mulher cristã! Depois de várias reuniões, o superintendente veio até a minha casa e me disse que meus privilégios me seriam devolvidos. Eu deveria esquecer tudo isso, passar uma borracha, afinal a tal da IMPERFEIÇÃO reina lá dentro!

     Feliz da vida, achei que tudo estava resolvido. Mero engano! Depois disso, eles nos congelaram espiritualmente. Partes, apresentações, orações, foram negados à minha família!


     Um dia, convidaram todos os jovens e até crianças  para relatarem experiências da escola e somente minha filha e dois "jovens-problemas" ficaram de fora. Até hoje, eu escuto a voz dela me perguntando: 'O que foi que nós fizemos? O que foi que eu fiz?' Comecei a notar que eu era "carta marcada", falei demais e o preço viria. Aos poucos fomos “morrendo”, e nas parcas visitas de pastoreio eu desabafava e na semana seguinte era dada uma apresentação e depois mais nada. Meu marido era um bom orador, uma pessoa super-amorosa, calmo, sincero mas o seu erro fora apoiar uma suposta REBELDE, SUA ESPOSA!

     Nos últimos 3 anos, fomos definhando “espiritualmente”. Minha filha, hoje, com 18 anos de idade, mudou. Antes ingênua e até bobinha, tornou-se desconfiada e com grande dificuldade de acreditar nas pessoas. Criamos uma sebe onde só entra quem confiamos. Tornamo-nos, com o tempo, frias e agressivas quando provocadas. Ganhei de brinde uma doença chamada FIBROMIALGIA, ou seja reumatismo muscular no qual sofri por 2 anos de dores terríveis nas pernas, nos braços e ombros. Causa? Segundo o médico é de fundo emocional, devido algum trauma psicológico, no meu caso, REJEIÇÃO. Para ajudar, nessa época eu havia descoberto que era filha adotiva. Imagine a minha cabeça como ficou.

    A rejeição da congregação continuou até chegar ao ponto de nesses últimos meses, eu e minha filha não sermos convidadas para nada, nem mesmo estudo bíblico, nem revisitas, nenhum telefonema, nada! Éramos estranhos, leprosos espirituais! Pedi ajuda, disse que estávamos morrendo, que aceitaríamos qualquer coisa, convites para revisitas, para estudos, mas nada! Começamos a faltar as reuniões, estudos de livros, mas em nenhum momento, sim, em nenhum momento, essa gente nos viu com olheiras, desarrumadas, cabisbaixas como eles gostam. Não! Eu e minha filha somos muito vaidosas, admiramos o belo, a elegância discreta que mulheres tais como Jackie K. Onassis souberam demonstrar em vida!

     Sempre amamos a Jeová e por isso, apesar de ver certas coisas com que não concordávamos, aceitávamos porque achávamos que nós, sim, nós éramos rebeldes, fracas. Onde já se viu pensar em questionar o uso de Relatórios, o porquê dessas malditas "horas", o poder da hierarquia, o escravo fiel e discreto que recebe o alimento – de que forma? Mensagens, telepatia, aniversários de casamento, despedidas com discurso e rapapés.

     Até que um dia, eu me sentei diante de meu computador e decidi ver os sites dos 'demônios', dos 'renegados', dos 'apóstatas que falam mal de Jeová' etc. etc. Quando comecei a ler o que você escreveu...

     Há uma semana eu pedi minha dissociação, minha filha e meu filho de 11 anos de idade não querem voltar nunca mais para lá. O problema é meu marido; ele está dividido. Ele é muito ingênuo, não sei o que dizer. Ainda não acordou do "transe" desses 10 anos! Graças a Deus, eu e meus filhos estamos livres!

     Esses dias têm sido difíceis para minha família.

    Como eu disse, meu marido ainda está dividido. Ele não conseguiu separar a adoração a Jeová da adoração à organização. Só o tempo vai nos dizer o que será dele. Embora ele não esteja indo ao Salão, sente-se incomodado com a minha alegria e a dos meus filhos. Minha filha não quer entregar a carta de dissociação. Ela me disse não se importar se algum dia for desassociada. Para ela aquelas pessoas são tão insignificantes, a ponto de não merecerem satisfação nenhuma. Acho que ela está certa. Até agora, não sei se foi dado o anúncio da minha dissociação, mas isso também não me interessa.

     Alguns dias depois...

     No dia 25/10/2001, meu marido e minha filha se dissociaram e, graças a Jeová Deus, estamos em paz!!

     É engraçado. Olhando para atrás, parece que tudo foi um pesadelo! Tenho a impressão que nesses 10 anos, eu não vivi lá dentro, as pessoas me parecem estranhas. O que no momento estou sentindo é a falta de educação, de ética, de amor para com aqueles que saem. Pessoas que anteriormente freqüentavam nossa casa, diziam-se nossos irmãos da fé, companheiros leais, dispostos a dar a vida por nós..., agora viram o rosto. Tenho pena. São produto da alienação humana, não possuem mais vida própria, são teleguiados por homens miseráveis! No filme "Matrix", a  dominação mental foi retratada fielmente; são tão judiados pelo sistema, que não estão preparados para serem desligados; alguns jamais  serão! Se você não assistiu, então reserve um tempo e assista!

Até mais.

 

A Justiça dos Homens

Início

 08/12/2001 

 

     Nos chamamos Ellen e José Luiz, somos naturais de São Paulo/SP. Fomos Testemunhas de Jeová por muitos anos e em maio de 1997 pedimos nossa dissociação.

     Saímos da Organização, pois não agüentávamos mais as pressões e humilhações as quais éramos submetidos. Tudo porque resolvemos denunciar as irregularidades que haviam dentro de nossa congregação. 

     A partir do momento que começamos a questionar e denunciar fatos que atingiam não só nossa pessoa como também outras, passamos a receber punições, perseguições, opressões e ridicularizações. 

      Muitas dessas degradações ocorriam por parte do ancião presidente. Isto porque denunciamos a família de seu pupilo e amigo pessoal e que  também era ancião. 

     No princípio esse ancião mostrava-se leal e disposto a ajudar. Reunimos provas dessas pessoas que trazia discórdia na congregação, expusemos os prejuízos que eles causavam a outros, como forjar provas fraudulentas – muitas delas desmascaradas – tudo para conseguir a desassociação de seus desafetos. Eram inúmeras as armações, mas, mesmo com todas essas evidências, juntamos provas documentais irrefutáveis!!!! Porém, todo o trabalho foi em vão. Esse ancião desaparecia com as provas e até mesmo entregava para nossos desafetos!!!! 

     E o pior de tudo isso era que o que falávamos ou apresentávamos virava-se contra a gente. 

     Cansados de lutar contra as injustiças e tendo a certeza de que nada do que fazíamos surtia efeito, resolvemos pedir a dissociação. Entregamos nossas cartas, pois todos nossos esforços para que se fizesse a justiça foi posto por terra e além do mais não tínhamos mais forças para continuar combatendo o mal que ali existia e já estávamos cansados demais de sofrer tanta injustiça. 

     Porém, nossa saída ainda não satisfaria a esse ancião, precisaria ainda mais. Foi então que no mês de setembro/98, dois anciãos recém-designados nos procuraram para nos oferecer ajuda. 

     Vieram em nossa casa com a justificativa de que precisavam do nosso testemunho e informações para concluir o caso e dar a punição a quem merecia de fato e a justiça seria feita mesmo que custasse o cargo de anciãos influentes da congregação!!! 

     O discurso foi convincente, aceitamos participar dessa reunião. E sem nos aperceber fomos atraídos para uma armadilha. A reunião não era para nos ajudar e sim para nos julgarem – era uma Comissão Judicativa!!!! 

     Ao entrar na sala vimos esse ancião que tanto tentou nos prejudicar. Ele estava de cabeça baixa o tempo todo e a comissão estava formada pelos anciãos recém-designados. Ele era o único experiente desse grupo, porém o mais despreparado dos anciãos começou a ler um texto sobre desassociação; ele nem esperou a gente sentar. A pressa era tanta para liquidar o assunto que eliminaram qualquer protocolo. 

     Foi então que interrompemos o que esse ancião estava lendo e lhe dissemos que não participaríamos daquela palhaçada!!! Fomos embora sem esperar o que eles tinham para dizer. 

     Uma semana depois do episódio voltaram em nossa casa para falar com meu marido e como não o encontraram ficaram cercando o quarteirão. Ao vê-lo, o pararam na rua próximo a nossa casa  e o informaram de que tínhamos sido desassociados e que se fosse de nossa vontade que recorrêssemos. Dentro do carro ficaram e nele foram embora como se nada tivesse acontecido. 

     Nunca em nossa vida tínhamos ouvido algo semelhante para um comunicado de uma desassociação e muito menos ser desassociados sem uma Comissão Judicativa. Era inédita aquela situação!!! 

     Mais inédito ainda foi o surgimento de quatro anciãos de outra congregação, dizendo que estavam em nossa casa para nos defender na 2ª Comissão Judicativa. Ficamos pasmos. No principio recusamos a ajuda, depois eles nos convenceram a contar nossa história e após ouvirem ficaram convencidos de nossa inocência!!! 

     Por fim participamos dessa 2ª Comissão Judicativa em 15/11/98, fomos ouvidos por 15 minutos cada um e com os anciãos da nossa congregação despenderam um tempo de 1 hora. E nesse meio tempo saíram dessa reunião para nos mandar embora, pois a conversa seria longa!!! Logo percebemos a manipulação do caso!!!!! 

     Fomos embora sem ser escutados devidamente!!!! 

     No dia 29/11/98 estes mesmos anciãos que tomariam conta do nosso caso estiveram em nossa casa para nos comunicar o resultado da Comissão. E ao perguntar-lhes sobre o motivo de nossa desassociação, nos responderam que foram muitos motivos e que eles mesmos não podiam nos dizer. 

     Como alguém é desassociado e não é lhe comunicado o motivo? Isto não existe!!! Até hoje não sabemos qual foi o motivo da desassociação, a única coisa que nos foi dita é: “Deixem isso para lá, um dia os que fizeram coisas erradas irão pagar. Basta confiar em Jeová”. E foram embora sem mais explicações!!!! 

     Antes que o anúncio oficial fosse realizado procuramos o Superintendente de Circuito para contar todas as injustiças que estávamos sofrendo. Para nossa surpresa, ele nos respondeu que não iria nos escutar e muito menos pegar nossas provas documentais, pois o assunto estava resolvido e se estivéssemos incomodados que procurássemos a Justiça Humana,  pois,  ele tinha  coisas mais importantes a fazer do que perder tempo com isso. Nesse momento ele nos deu as costas e foi embora com a consciência mais tranqüila do mundo. 

     A partir daí, tivemos a certeza que a mentira prevaleceu sobre a verdade. Usaram meios ilícitos, desumanos e degradantes para conseguir provas fraudulentas, sem que os réus (nós) tivéssemos conhecimento dos fatos imputados!!! 

     Afirmamos, portanto, que em todo o tempo que fizemos parte dessa Organização foram usados artifícios para que a justiça não fosse realizada, onde deturparam falas e argüições com o intuito de induzir ao erro, mostrando assim uma conduta criminosa. 

     Muitos de nós somos induzidos e obrigados a admitir erros ou coisas não praticadas para que os verdadeiros culpados não paguem por muitas vezes pertencerem à dianteira. E automaticamente somos forçados à condenação pré-determinada, para que esses protegidos não precisem admitir seus erros, sua arbitrariedade, suas injúrias e fraudes, tudo para que não sejam expostos publicamente seus atos parciais e no mínimo incompetentes para  dirigir um caso ou uma Congregação e por fim não perderem seus cargos de prestígios, pois lhes rendem uma posição de destaque. 

     Para nós restou a desolação, fomos colocados à posição de criminosos, execrados em praça pública. Submetidos a comentários maldosos!!! 

     Uma coisa é certa: É impossível sair dessa Organização sem que haja seqüelas ou traumas propriamente ditos. 

     Muitos de nós na busca da verdade nos deparamos com três estágios:

  1. LUTA: quando tentamos combater ensinos humanos, pois, acreditamos ser corretos interiormente e que deva ser também externamente;

  2. FUGA: é a tentativa de se desvencilhar dos grilhões da Torre;

  3. PARALISIA: a sensação de impotência é maior, e atreveríamos  a dizer, quase um instinto de sobrevivência.

      É nesse estágio que muitos de nós passamos ou ainda muitos passam, pois, assim como os animais paralisam-se para manterem-se vivos, assim ocorre conosco quando vemos que os esforços dessa luta estão sendo em vão. 

     Vem à tona nesse exato momento, o lado sombrio e desumano, dessa luta desigual. Pesamos na balança nossos conflitos pessoais que viveremos após a saída da Organização, que são eles: 

     a) Perda de amigos queridos que nos repudiarão quando colocarmos nossos pés para fora da Organização;

     b) Tratamento desumano;

     c)  Por último o mais aterrorizador: Como será a minha vida fora da Organização?!?! 

     Este último item é o mais pesado dos fardos, pois, tanto tempo enclausurado mentalmente pela Torre  resulta em medo da LIBERDADE E O QUE FAZER COM ELA e como lidar com situações no mundo lá fora onde não existe alguém que nos diga o que devemos ou não fazer. 

     Do mesmo modo se dá com um prisioneiro que passou a vida inteira cumprindo pena e ao sair não sabe o que fazer com sua liberdade e muito menos que caminho seguir! 

     E todos aqueles que se libertaram da Torre viveram esse dilema, tiveram que aprender a caminhar novamente enfrentando seus medos e exorcizando seus próprios demônios. Pois, até então, caminhávamos e pensávamos conforme a Torre. 

     O pânico de passar por essas experiências traumáticas e que nos provocam sofrimentos e angústias nos privam muitas vezes de prosseguir a jornada da Libertação, afinal  de contas, não é fácil passar por isso sem nenhum arranhão.  Mas não podemos deixar que o nosso coração calejado  por tanta opressão vista e até mesmo vivenciada seja ainda mais ferido e machucado. Não podemos parar de buscar a justiça e a verdade, é ela que nos conduz a total Liberdade. 

     Assim sendo, podemos afirmar com todas as letras que nos tornamos vítimas emocionais da Torre, pois, a cada dia que passa pessoas são bombardeadas pela "verdade absoluta" - ditas pelo CORPO GOVERNANTE que  ferem muitas vezes o nosso modo de pensar. Situações essas difíceis de lidar, principalmente quando não vemos saída para tal situação colocada pelo CORPO GOVERNANTE. Esses conflitos internos produzem em nós efeitos negativos, tais como: sensação de impotência, depressão, estresse, ansiedade... Sentimentos esses que nos colocam cada vez mais dependentes da Organização, onde só no aconchego de suas muralhas encontraremos a salvação. Será isso verdade? 

     Fomos e muitos ainda são prisioneiros da consciência, nosso medo de abandonar a Deus nos tornam mais culpados, o que resulta na privação da Liberdade em relação à Torre. Pois, o CORPO GOVERNANTE funde a Organização e Deus, tornando-os como uma única partícula inseparável. Ir contra a Organização é ir contra Deus. Mais uma vez perguntamos, será isso verdade? 

     Acreditamos que não, pois, o Corpo Governante não pode afirmar ser "o dono da verdade". Na melhor das hipóteses deveriam dizer que vivem em busca da verdade, este seria o melhor caminho. 

     Porém, acreditamos que existe solução para todos esses males provocados por essa Sociedade, da qual muitos de nós fomos e muitos ainda continuam sendo vítimas. Essa cura está em nosso alcance, trata-se das muitas Home Pages tais como as do Cid, Odracir, Osarsif, Don Lucca, Luis Lopes, Beto e outros de excelente teor que nos oferecem uma única coisa primordial: A VERDADE! Quem viveu situações tenebrosas dentro da Organização como nós, podem afirmar que os relatos são fielmente descritos, para que não haja dúvidas. 

     Eles nos devolvem a paz de espírito, a coragem, a dignidade e a oportunidade de viver novamente como seres humanos livres e vencedores. 

     Todos os caminhos a serem seguidos são válidos (religiosos ou não), o importante de tudo isso é que: dogmas humanos e arbitrários, baseados em individualismos acabem, pois,  afastam pessoas umas das outras em prol do nada. É o que a Torre fez e faz com muitos que tentaram a Liberdade ao se dissociarem ou até mesmo aos que foram desassociados!!! 

     A Torre em nome da "pureza espiritual da Organização" ataca qualquer pessoa que se mostre avesso às suas idéias ditas como certas e providas por Deus, qualificando-as como pessoas de " pouca ou sem nenhuma fé"! Promove ela (Torre): ódios, rancores, mágoas pessoais entre seus adeptos, em nome do que e de quem?!?! 

     Esperamos que em um dia bem próximo novas luzes venham brilhar e que a Torre traga novas esperanças com a verdadeira justiça e que esse tempo sombrio que foi para muitos de nós faça parte de um passado remoto.  

     E ainda esperamos viver para vê-lo e quem sabe ver alguns membros que ainda farão parte dessa Organização vivendo em harmonia e paz entre si e com outros que não compartilham da mesma religião.   

 

Rompendo os Grilhões

Início

10/09/2003

   Tudo começou no início dos anos 80. Meus pais eram pessoas de pouca instrução escolar e minha mãe, em especial, buscava uma religião que preenchesse suas necessidades.

   O anseio de minha mãe era tal que ela já havia passado por diversas delas: catolicismo, culto evangélico, umbanda e assim por diante. Depois de casada, minha avó paterna a introduziu no espiritismo, mas ela aparentemente não se deu bem; decidiu-se enfim pelo catolicismo, mas preservava uma mente aberta. Parecia que iríamos crescer em um ambiente democrático em sentido religioso, minha mãe católica e nos levando às missas de domingo e meu pai estudando com adventistas.

   Foi quando minha mãe aceitou um estudo bíblico com uma senhora Testemunha de Jeová.

   Até então a única opinião de meus pais sobre Testemunhas de Jeová era que não passavam de um bando de chatos inoportunos sem ter o que fazer. Mas mamãe havia gostado daquela senhora tão gentil (ela sentia um certo apego por senhoras da idade da mãe dela) e resolveu aceitar o convite.

   No início, ela dava um jeito de escapar do estudo; fingia que não estava em casa, se escondia no quarto... Não adiantava. A simpática senhora pacientemente voltava no dia combinado. Até meu pai repreender minha mãe por estar fazendo uma mulher idosa de boba e aí ela decidiu levar o estudo mais a sério.

   Pouco a pouco, nós, os filhos, participávamos do tal estudo. As respostas simples e aparentemente fundamentadas, os livros bonitos e o fato de a Bíblia ser amplamente usada contagiava-nos. E quando começamos a freqüentar as reuniões, ficamos mais impressionados ainda com que ouvíamos da tribuna e com aquelas pessoas tão educadas. Minha mãe deixou definitivamente a Igreja para começar a freqüentar o Salão do Reino.

   Meu pai era o único que ainda resistia àquela religião, pelo menos até a sua formatura na Igreja Adventista. Em troca de ir assistir à cerimônia, minha mãe o fez ir conosco naquela que seria a nossa primeira assembléia de circuito. Impressionado com o que assistiu, decidiu que acompanharia minha mãe, e no espaço de poucos anos, todo mundo em casa havia se batizado.

   O zelo dos meus pais me influenciou muito. Com os meus sete anos de idade, eu já era contada como companheira de pregação, ninguém me designava para acompanhar dois adultos porque eu já falava bem.

   Com oito, fui matriculada na Escola do Ministério Teocrático e era elogiada por todos pela minha desenvoltura ao preparar e desempenhar minhas partes praticamente sozinha.

   Finalmente, resolvi me batizar, contra a vontade de meus pais, que me achavam nova para tanto. Porém, o irmão que me preparou para o batismo deu carta branca e eles consentiram. Eu tinha dez anos.

   Muitas pessoas diziam que era um orgulho para os meus pais ter uma filha bonita e tão inteligente, e é claro que eu ficava envaidecida. Mas o tempo provou que, afinal de contas, eu poderia ser qualquer coisa, menos inteligente.

    Comecei a entrar naquela fase de pensar em garotos. Já havia dado o meu primeiro beijo, mas como boa cristã, levava as orientações a sério evitando assuntos do gênero. Para minha surpresa, minhas “irmãs cristãs” da mesma idade começaram a me evitar por causa disso! Passei a ser considerada “esquisita” e “impopular” por conta desse meu jeito. Não me dava nada bem com outras garotas e para piorar, o sexo oposto “cristão” desconsiderava por completo a minha existência.  Resultado: passei a me isolar das pessoas, minhas únicas companhias eram outros poucos marginalizados, meus irmãos carnais (diferente de mim, bem populares) e os amigos deles.

   Que paradoxo, não? Era a encarnação do ideal de jovem TJ reverenciado pela Sociedade, mas a grande maioria deles, (inclusive muitos filhos de anciãos do tipo que fazem pose de exemplares nas assembléias e congressos, cujos pais são mais influentes e com mais grana no bolso) repudiava pessoas como eu. Conforme eu mais convivia com aquelas pessoas, percebia cada vez mais que a maioria daquelas experiências de jovens exemplares relatadas em revistas e reuniões ou eram casos isolados ou eventos existentes somente na imaginação dos editores da Sociedade. E não fazia diferença a congregação; mudamos algumas vezes e até visitávamos congregações diferentes para ampliar o círculo de amizades, uma vez que amizade com “pessoas do mundo” era muito mal visto, especialmente por meus pais. Tudo igual.

    Seria preciso escrever um livro para relatar quanta irregularidade já vi lá dentro. Em uma ocasião umas “irmãzinhas” (uma delas se dizia “amiga” minha desde a infância) vieram em casa quando eu estava sozinha e queriam muito falar com dois de meus irmãos que se encontravam em um estudo de livro. Veja só, vieram chamá-los para uma festa e não queriam me convidar! O motivo? Eu era “certinha” demais e supostamente poderia dedurar aos pais delas algo que aprontassem!

    E quando uma irmã minha foi desassociada e estava querendo “voltar para Jeová?” Não bastasse o exílio social em que se encontrava, ela era obrigada a ficar do lado de fora do Salão depois do término das reuniões, enquanto cumprimentávamos outros irmãos. O ancião presidente chegou a ameaçar de desassociação a minha irmã mais velha. Motivo? “Se associar indevidamente” com a expulsa. Infernizou tanto que quase acabou com o casamento dela, já que o marido tomou partido do ancião. O superintendente de circuito deu uma merecida bronca nesse ancião, mas fica a pergunta: agiria ele dessa forma se a orientação da Sociedade para com os desassociados fosse outra?

    Quantas e quantas vezes não presenciei meus próprios pais (inclusive eu mesma, me envergonho muito disso hoje) e outros “cristãos” julgarem pessoas por serem TJ’s ou “mundanos”? Quantas ocasiões minha mãe não se opôs à amizade com jovens que, apesar de filhos de TJ, não eram batizados e por esse motivo, certamente não eram “boa companhia.”?

   Se eram “afastados”, a mesma coisa: Se eram desassociados ou dissociados...Bem, você sabe... “Apóstatas detestáveis”. Isso para não mencionar aquela expressão nojenta livremente usada por uma irmã com quem eu convivi por uns tempos para se referir a “mundanos”: “presunto vivo”. Evidente que ela e muitos outros se sentiam à vontade para se sentarem na cadeira de Juiz da Humanidade.

   Nós mesmos fomos vítimas dessa segregação religiosa. Certa vez, quando ainda éramos novatos, meus irmãos e os filhos de uns anciãos tiveram um desentendimento.  Adivinha quem levou a culpa porque certamente ainda guardava hábitos “mundanos”?

    Minha mãe, uma típica ovelha da STV, nunca admitiu que abandonássemos a fé, então ela era o meu estímulo e por pura passividade minha tratava-me como criança; mesmo já adolescente, se eu discordasse de algum ponto de vista dela, ameaçava me bater na frente de quem quer que fosse, para o meu embaraço.

   Dentro ou fora da religião, eu não fazia muito sucesso: por ser tão “estranha” sofri zombarias da maioria dos meus colegas durante a maior parte do 1° grau. Pelo menos uma vez eu saí em prantos da escola. A outra vez, foi do Salão. Talvez por pena da minha solidão, meus pais até aprovavam algumas amizades minhas com meninas “do mundo”, com quem simpatizavam, embora isso não fizesse eles questionarem a pretensa classe dos “escolhidos” de Brooklin.

    Mesmo com tantas coisas revoltantes acontecendo à minha volta, eu me apegava à minha religião. Era o que dava sentido à minha vida, era a única coisa em que eu era boa, já que vivia desempregada e era um fracasso em tudo: esportes, amizades, paqueras.

   Na última congregação que freqüentei fiz algumas boas amizades, mas a rejeição dos garotos do Salão me irritava. Era sempre assim: quando achava um garoto interessante, dava a entender que estava a fim, mas eles arrumavam uma desculpa para me rechaçar, fosse por que eu era “crente” demais, fosse por que eu queria namoro sério e eles só queriam “ficar” (e isso é algo condenado pela Sociedade, que interessante...) ou simplesmente por não ser a mais disputada. 

   Era engraçado que nos discursos vivem dizendo que “o cristão escolhe seu cônjuge com base nos valores espirituais, não na aparência” e mal terminava a reunião, o contrário acontecia. E de fato, os “irmãos” escolhem a aparência, a cor, a idade. A perspectiva de uma vida eterna no paraíso parece não ser levada em conta por certos irmãos, interessados somente em menininhas. Já conheci muitas irmãs que não arrumam namorado só por que passaram dos 35 anos. Imagine, você só pode casar com outro TJ, mas homens dentro do Salão são minoria e ainda por cima interessados em garotas de 20 (quando eles mesmos já passaram do 30).

   Não estou dizendo que os não-TJ são melhores que os TJ.  Pessoas de bom e mau caráter existem em todo credo, país e grupo social. Mas lá dentro, impera a mentalidade de que ser TJ batizado é uma virtude por si só, enquanto ser de outra religião significa ser propenso aos vícios humanos a menos que você prove o contrário.  A Watchtower acusa todo mundo de discriminação religiosa, coisa que ela é a primeira a fazer.

   A essa altura, em matéria de zelo religioso, era uma sombra do que já fui, não mais engolia tudo que vinha da tribuna. Havia passado por uma situação muito humilhante nas mãos de um irmão, que só faltou dizer na minha cara “você é feia!” com todas as letras. O fato de ele ter um gosto estético duvidoso, já que se casou com uma garota “mundana” horrível e as outras que ele namorou serem mais mocréias ainda na opinião da congregação, pouco ajudou: ele não era o primeiro a me rejeitar e preferir uma “mundana”, mas foi o único que me destratou. Não me lembro de ninguém tê-lo repreendido, nem a própria mãe dele, que dizia gostar de mim, nem os meus irmãos homens, que esguichavam testosterona perto do meu namorado “mundano” (explico mais pra frente), mas nem sequer pararam de andar com ele. Mesmo quando ele engravidou a namorada “do mundo” não foi desassociado: conforme mais tarde contou aos meus irmãos, bastou falar o que os anciãos queriam ouvir e casar com a moça.

   Resolvi fazer um curso para arejar os horizontes. Comecei a conviver com pessoas bem diferentes de mim; TJ, um adventista, católicos, espíritas, etc... No começo, ainda persistia aquela convicção, ainda mais por que estava amiga de um Tj que conhecia há muito, mas que nunca foi meu amigo íntimo.

   Comecei a encucar com certas coisas que observava. O adventista era um rapaz correto, dos meus colegas Tj, um era meio depravado outro era novo na religião e outra era uma acomodada; minha amiga católica era virgem por opção, minhas duas outras amigas, espíritas, eram diferentes uma da outra. Quanto mais eu convivia com essas pessoas mais me revoltava aqueles exemplos de jovens Tj desviados para as drogas e sexo por causa de colegas de outras crenças. Se tivessem visto um debate nosso sobre sexo pré-marital, onde o único a defender abertamente o sexo dentro no casamento foi o menino adventista enquanto o meu amigo Tj só dizia besteiras, duvido que relatariam o exemplo dele numa assembléia.

   Comecei a ter convivência social com os meus novos amigos. A primeira vez que fui visitar a minha amiga católica, minha mãe agiu como se eu estivesse indo à zona. Mas nem ligava mais, eu estava cada vez mais convencida de que pessoas não Testemunhas não eram nem melhores nem piores do que nós.

   As coisas realmente complicaram quando um colega de turma se apaixonou por mim. Como eu não mais estava nem aí com os requisitos do Salão (já nem ia com muita vontade mesmo) acabei aceitando. Minha família, claro, foi contra, mas eu bati o pé.  Com o passar do tempo, eles se conformaram.

   Mas, antes disso tive muita dor de cabeça. Não podia sair com o meu namorado que a minha mãe me aborrecia. Algumas amigas TJ passavam a maior parte do tempo tentando me convencer a largar dele. Como eu poderia fazer isso? Ele era a melhor coisa que Deus pôs no meu caminho, sempre foi educado, bonzinho. Não adiantava explicar que ele me amava; para todos, o que importava é que ele não era TJ e nem bonito o suficiente para mim, como se isso fosse essencial para um relacionamento. 

   Continuar ali dentro estava virando um fardo, entretanto não saía. Já fazia algum tempo que revirava a Internet e até passei por algumas páginas “apóstatas”, mas nunca as levei a sério. Um dia resolvi analisar mais atentamente aquilo e devo confessar, foi interessante. Algumas das coisas que li me pareceram absurdas (na verdade, a maioria) e comecei a checar informações, fuçar daqui, comparar literaturas da Sociedade ali... Meu pai estranhava eu carregar pilhas e pilhas de livros para o quarto, porém nem por um minuto imaginou o que eu estava fazendo. Durante semanas analisei as páginas e as comparei com as referências que traziam.

   Exageros de alguns autores à parte, suei frio quando eu constatei que muitas daquelas informações tinham fundamento. Por mais que eu pesquisasse uma prova do contrário, não adiantava, a informação batia! 

   Fiquei totalmente abalada. Acho que agora deu para entender o que eu quis dizer a respeito de inteligência. Tinha 2° grau completo, lia bastante e ainda assim não havia me dado conta de que 607 AEC, pilar da própria crença na Torre de Vigia, nada significava por que Jerusalém não caiu nessa data e sim uns 20 anos depois (em 587). Isso estava registrado em qualquer livro de ginásio, bem debaixo do meu nariz. Isso sem falar na proibição das transfusões de sangue e os outros absurdos inculcados durante anos e anos pelo “escravo fiel” que um pouco de pesquisa em biblioteca e comparações entre publicações da própria Torre revelou o que, no fundo, já sabia: a única diferença das Testemunhas de Jeová para outras religiões era o nome do movimento. Isso tudo incluindo os “ajustes” de entendimento que acompanhei durante os meus anos lá dentro, tais como a idéia de que a geração que presenciou os acontecimentos de 1914 veria o fim (abandonada em 1995 por motivos óbvios).  Como desabafo, inclusive, mandei um e-mail para a sua página, Odracir, prometendo um depoimento.

   Mais do que nunca, tive vergonha de mim mesma e me enchi de autodesprezo. Afinal, como poderia me considerar inteligente se nem leitura crítica das publicações eu fazia? Se eu aceitava tudo que escreviam ali sem perceber que havia coisas que não batiam? Na verdade era uma analfabeta intelectual; sabia ler, no entanto absorvia como verdade e nem sequer consultava as referências bibliográficas das obras. E o pior, fazia isso com qualquer livro. Se a obra discordasse das opiniões da Sociedade, eu simplesmente a punha de lado sem nem mesmo analisar o argumento.

   Não tinha mais dúvidas sobre o que era na verdade a Sociedade Torre de Vigia, mas o medo de minha família ainda era maior do que a minha dignidade. Continuei indo às reuniões, embora isso significasse engolir minhas opiniões. Não queria que eles concluíssem erroneamente que meu namorado fosse o responsável pela minha saída. Na verdade, ele apoiou a minha decisão de continuar lá dentro.

   No início tencionava me afastar só um pouco, pois como minha família toda era da religião, eu temia o pior. Mas saber da verdade tornava as coisas difíceis; eu não respondia mais nas reuniões, procurava não sair no campo. Quando não tinha jeito, eu me limitava a oferecer revistas porque me sentia mal de ensinar coisas que eu sabia serem incorretas. Meu consolo era me abrir com os meus amigos “mundanos”, que nesse período difícil, juntamente com o meu namorado, foram de grande ajuda para mim. Na escola, quando os meus amigos TJs não estavam por perto, contava tudo para os outros sobre o que acontecia na Organização. Todos eles ficaram surpresos com a minha situação e se revoltaram quando contei, entre outras coisas, como as Testemunhas de Jeová tratam os desassociados e os que saem por vontade própria, ainda mais se for para outra religião.

   Não me arrependo muito menos me considero traidora quanto a isso: a Sociedade gosta de apontar defeitos e fazer críticas às outras denominações em suas reuniões e suas literaturas, gostam de incentivar as pessoas a examinar suas religiões e gostam de fazer pregação ativa de porta em porta. Mas quando se trata dela ser questionada e examinada, ela põe de lado toda a conversa sobre liberdade religiosa e promove uma verdadeira inquisição espiritual, atirando na fogueira reputações e expulsando qualquer um que discorde abertamente de seus dogmas.  Ao falar com meus amigos, não fiz nenhuma acusação falsa; apenas dei informações sobre como as coisas realmente são lá dentro. Se algum dia eles se interessassem em entrar nessa organização, pelo menos saberiam o que esperar dela, ao contrário do que aconteceu comigo e com tantos outros desavisados.

   Um belo dia meus pais anunciaram a venda da casa e a mudança para uma cidade distante da capital. Enlouqueci com a idéia de ficar longe do meu namorado e dos meus amigos. Pensei e resolvi fazer uma coisa que já estava na minha cabeça há semanas: no dia da mudança anunciei o meu afastamento. Minha mãe chorou, meu pai me declarou inimiga, o céu desabou na minha cabeça. Estranhamente fiquei tranqüila ante aquela tempestade e expliquei calmamente o motivo. Claro que mal me ouviram, pois os motivos para as mentes preconceituosas de meus pais eram outros: sexo, pressão de amigos e muitas outras besteiras. Não entrava na cabeça deles que, independente dos valores em questão, eu estava me afastando por falta de provas convincentes de que aquela era a única religião verdadeira e na altura de meus 20 e poucos anos, não poderia ficar em uma religião só por medo de desagradar à família.

   Não foi fácil manter aquela posição. Fiquei triste por meus pais, mas ingressar ou deixar uma religião era um direito meu e não era minha culpa se eles agiam como se eu tivesse cometido um crime. De qualquer forma, a distância ajudou; meus pais não me enchiam de sermões.

   Não demorou muito, minha ausência foi percebida; bem nos dias em que minha mãe estava de visita em casa (sem ter como se manter no interior, meu pai continuou a trabalhar aqui para sustentar a casa que comprou), dois anciãos vieram me visitar para saber o motivo de meu afastamento. Pedi para minha mãe nos deixar a sós e abri o jogo com eles. A notícia os desagradou muito e eles tentaram rebater as minhas críticas com aqueles raciocínios bem a là cartilha da Watchtower. Para algumas perguntas para qual eles não tinham respostas veio aquele chavão “Espere em Jeová que ele responderá no seu devido tempo”.   Nas duas semanas seguintes, os dois voltaram na esperança que eu mudasse de idéia, mas nada adiantou, já que não puderam me convencer. De modo que recebi um ultimato: ou eu voltava a comparecer às reuniões e engolisse tudo o que falei ou deveria deixar de vez a congregação. Respondi que preferia me manter apenas afastada, mas o ultimato prevaleceu, já que tinham medo de que eu espalhasse minhas opiniões aos outros. Não deu outra: fui anunciada como “dissociada”, embora nem tenha feito uma carta de próprio punho nem tivesse em mente fazer aquilo naquele momento. Os próprios anciãos redigiram a carta (o conteúdo desconheço até hoje) e se apresentaram como testemunhas. O meu caso gerou alguns acontecimentos cômicos. Por exemplo, cheguei a receber uma visita de uma irmã que mal falava comigo me implorando para voltar e me perguntando o porquê da minha saída. Procurei explicar, tentando raciocinar com ela dos meus motivos. Ela não me deu uma razão plausível sequer para eu voltar atrás: na verdade, admitiu que não entendia profundamente as bases das coisas que eu falava. Isso só reforçou mais a minha atitude.

   Claro que o pessoal de casa recebeu a notícia como uma bomba, mas creio que, já que eu estava afastada há algum tempo, eles estavam mais ou menos preparados para isso.

   Já se passou cerca de um ano desde que tudo isso aconteceu. Ainda enfrento os mesmos problemas de adolescência: tenho um quarto de século e estou sem profissão definida, não tenho nenhuma habilidade, muito poucos amigos, me acho feia e me sinto mal só de chegar perto de garotas que fazem sucesso com rapazes. Aliás, meu namorado e eu estamos em uma pequena crise amorosa e no momento em que estou acabando de escrever isso, estamos sem nos falar há dois dias.

   Não me tornei melhor ou mais esperta e nem me livrei de problemas só por que abandonei o movimento, a Sociedade imagina que a gente pensa dessa maneira.  Por outro lado, não me envolvi com drogas, crime, prostituição nem acabei na miséria moral, como gostam de relatar para os seus leitores. Tenho, todavia, consciência de que a Sociedade não foi a única responsável por meus dilemas, a maioria deles eu deixei entrar e se instalar na minha vida. Terei de encará-los e lutar contra eles.

   Considero até a possibilidade de procurar orientação psicológica para me conhecer melhor. Sinto-me como uma criança, aprendendo a andar com as próprias pernas pela primeira vez, com um mundo inteiro a descobrir, porém ainda insegura e desajeitada por ter dependido por tanto tempo de um andador, a Watchtower. Ainda estou aprendendo a pensar e raciocinar, procurar orientação sobre o certo e o errado, sem, é claro, deixar que uma organização humana dite cada movimento meu.

   Ao menos tenho orgulho de ter dado o passo mais importante: tomar uma atitude ao invés de me acomodar e fingir que não sabia de nada. Minha irmã, ex-desassociada, comentou que me acha mais desinibida e solta do que quando eu era Testemunha e que ela mesma, embora constate muitas irregularidades, jamais teria a mesma coragem que eu, de enfrentar nossa família e os irmãos da congregação.

   O meu relacionamento com a família ficou um pouco mais distante; meus amigos TJ e meus cunhados nunca mais me dirigiram a palavra. E assim vai ser a menos que um “novo entendimento” anunciado pela Sociedade mude as coisas. Minha vida ainda está fora do que considero ideal, mas pelo menos estou livre de regras mentalmente restritivas ou da idéia de que devo ser submissa ao sexo oposto e  coisas similares.

   Não faço idéia da identidade de Deus, mas de uma coisa tenho certeza: se Ele existe, o Seu amor e Desígnios estão acima de idéias de “pretensos escolhidos” de mente estreita ou de religiões regreiras. Ele nos dá um mundo de oportunidades. E eu pretendo aproveitar o que ele dá.

   Quanto à morte, nem medo nem angústia. Afinal, como disse a mãe de uma amiga minha: “Você vai descobrir o sentido da vida quando morrer”.

   Atenciosamente,

   “SC”

    P.S: Como você deve ter sacado, eu sou aquela pessoa da carta “Fases”. Meus agradecimentos e solidariedade a você e a tantos outros cuja pesquisa e dedicação ajudou muito. Espero que esse depoimento ajude a outros a ter uma mentalidade mais aberta e tolerante a outras crenças e opiniões, bem como a rever os próprios conceitos. Desculpe pela demora!

 

Desmistificando Betel

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Kid Jansen, Brasil, 23/8/2008

 
      Olá Odracir.
 
       Fui testemunha de Jeová por aproximadamente nove anos. Neste curto período de tempo posso dizer que tive uma carreira meteórica nas hoste da torre de vigia. Hoje fazendo uma auto-análise dessa minha experiência, afirmo categoricamente que nunca tive a fé de um Abraão. De fato, duvido se algum dia depositei mesmo um mínimo de fé em tudo que aprendi com as testemunhas de Jeová. Digo isso porque os ensinamentos da torre de vigia não produziram em mim nenhum efeito capaz de modelar minha personalidade a semelhança daquilo que Jesus ensinou como padrão de vida cristã baseado no amor pelo próximo e mesmo por aqueles que me eram caros tanto dentro da organização como no ambiente familiar. Se não tinha a fé de que falei, uma coisa é certa: tinha muito entusiasmo. Este entusiasmo me levou a ser pioneiro auxiliar, regular, a servir como voluntário por quase três anos no betel de Cesário Lange, Guaíra (ali como serviço gerais, uma vez que na época o prédio estava vazio, era um grande elefante branco que a torre queria desfazer-se. Acho que já deve ter conseguido visto que fica em área nobre da zona sul de São Paulo, no bosque da saúde ) na construção do salão de assembléias de Vargem Grande Paulista e, por fim, no salão de assembléias de Sapucaia do sul, RS, retornando a betel de onde regressei para a congregação aeroporto, cujo ancião presidente era o irmão M. B., por quem tinha verdadeira admiração, dada sua humildade e gentileza ao tratar com os irmãos. Gentileza entre aspas, ja que todo relacionamento dentro da organização é apenas um verniz porquanto está baseada única e exclusivamente na aceitação dos ensinamento do corpo governante e na permanência dentro da congregação. Fora desses pressupostos não há um mínimo de consideração pelo associado.

     Eu, ipsi literis, era um fundamentalista religioso que tinha prazer de fazer citações das revistas a sentinela e despertai, bem como das recomendações do corpo governante para os irmãos ao ponto deles se sentirem amedrontados com minha presença quando tomava a dianteira em qualquer atividade "teocrática". Era um homem de organização. Disciplinado. Programado para aceitar, jamais para pensar ou questionar, salvo o comportamento dos outros, até mesmo dos anciãos dentro da congregação quando julgava que eles estavam tratando com leniência as fraquezas dos outros. Até que minha máscara caiu quando me vi diante da fraqueza de cometer conduta desenfreada nas noitadas de Fortaleza e ser confrontado pela minha mãe que exigia que eu fosse ter com os anciãos e contasse de minhas bebedeiras, ocasião na qual eu tive de dizer a ela que não sentia mais prazer de frequentar as  reuniões e que iria escrever uma carta em caráter irrevogável pedindo a dissociação. O que fiz. Um dos anciãos ainda tentou argumentar comigo ao encontrar-me em uma mesa de bar com um cigarro em mão e um copo de cerveja em outra. Eu disse a ele que um dia poderia voltar mas que naquele momento a situação era irreversível. Ao que atribuo esta paulatina falta de fé, a minha experiência de vida em betel. Enquanto a revista a sentinela destacava com ênfase cada vez mais frequente a prática dos frutos do espírito nas relações entre anciãos e irmãos exortando que se praticasse o amor, a misericórdia, que se mostrassem tal como Jeová, compassivo para com as imperfeições humanas, buscassem seguir o exemplo de cristo que amou a congregação e a tratou como marido amoroso, em betel a justiça era implacável. Ir para o café da manha tornou-se para mim um tormento. Depois de considerado o texto diário e terminada a refeição antes da oração era praticamente diário ouvir o dirigente do texto dizer: "informamos à família de betel que o irmão tal foi despedido, ou convidado, ou desassociado, ou expulso de betel". Às vezes à pessoa saia às pressas sem poder sequer despedir-se dos amigos, talvez até sem ter o dinheiro da passagem dado a rapidez de um julgamento precipitado. Lembro-me de perguntar a certo irmão porque na congregação os anciãos eram mais compassivos e misericordiosos e em betel a justiça era rápida e implacável. Ele me respondeu que em betel já era como se estivéssemos no paraíso terrestre, onde também não haverá mais a misericórdia praticada pelo humanos, uma vez que todos terão conhecimento e caindo em pecado será automaticamente destruído, sem ter que esperar o fim do milênio, em harmonia com o disposto em Isaías onde se le que ao morrer com cem anos se estará morrendo como jovem. Tudo lá é baseado em regras humanas. Há  regras para tudo, chega a ser asfixiante. Ao ler escondido um trecho do livro organização de filial, na biblioteca de betel, fiquei  escandalizado quando o corpo governante adverte os membros da comissão de filial que fiquem atentos com alguns que entram no serviço de pioneiro porque são preguiçosos e não querem trabalhar, talvez estando em tal serviço para angariar algum tipo de vantagem dos irmãos. Diante do exposto e já estressado daquela rotina mecânica, fui ao escritório de serviço e comuniquei que estaria voltando para Fortaleza me utilizando da falsa argumentação que a maioria usa para encerrar seu serviço em betel: ajudar a família. Ao sair de lá já não era mais o mesmo. O entusiasmo havia bruxuleado. Faltava só o tiro de misericórdia e ele veio na congregação aeroporto. Não por falta de espaço, mas por inapetência espiritual. O monstro que estava acorrentado dentro de mim pelo conhecimento intelectual da palavra de Deus finalmente arrebentou as grades e fugiu. O Carlos Silva,  a quem conheço, acompanhou de perto parte deste drama.

     Fora da organização, fui tocar a minha vida. Casei-me, gerei filhos, mas sempre com a pretensão de um dia voltar para organização. No entanto, por forças das circunstâncias, estava em um cyber café quando veio à mente a idéia de fazer uma pesquisa na internet sobre as testemunhas de Jeová e deparei-me com o site Observatório da Torre. Ali tomei conhecimento do livro "Crise de consciência", de Ray Franz. Fiz então uma pesquisa usando o nome de Ray e fui remetido para site do Cid Gadelha para quem enviei um E-mail perguntando como deveria fazer para adquirir o livro crise de consciência. Não o adquiri por meio dele porque não queria me comprometer com nenhum tipo de posicionamento contrário as testemunhas, mas julgava vital ler esta obra para tomar uma posição. Descobri o site da editora Hagnos e  informei-me como poderia adquirir aquela obra aqui em Fortaleza. Fui a casa da bíblia e finalmente encontrei o que procurava. Li o livro e minha mente se abriu. Cid passou meu e-mail para o Carlos Silva e começamos então a nos comunicar. Neste ínterim conheci o seu site, li o seu artigo "O Lado Negro da Força" e fiquei maravilhado com a clareza de raciocínio bem exposto naquele excelente trabalho. Por um tempo deixei seu site de lado, posto que me comunicava com maior frequência com o Carlos Silva. Quando finalmente ele revelou sua identidade para mim fiquei estarrecido, jamais poderia imaginar que se tratasse de tal pessoa, nem no meu maior devaneio cheguei a cogitar que fosse este brilhante companheiro, cuja identidade não posso revelar porque não tenho autorização mas estou certo de que você sabe de quem estou falando. Ontem me lembrei de seu artigo "O Lado Negro da Força" e fui dar uma revisada em tão boa matéria sobre o controle mental das organizações religiosas na mente dos fiéis. Antes porém, resolvi acessar seu Mail List e sua seção de e-mail que li todos. Olha sinceramente, além de muito instrutivo é simplesmente divertidíssima a maneira como responde aos defensores da torre de vigia. Enquanto estou lendo, às vezes varo a madrugada, me pego dando estrepitosas gargalhadas ao ponto de minha mulher perguntar de que eu rio tanto. O seu debate com o Hermman e sobretudo com o "justiceiro" quase me faz mijar nas calças. Estou examinando todo o conteúdo de seu site. É muita coisa mas chegarei até o final. Parabéns, querido, você é realmente sensacional.

 

 

Tempos de Descobertas

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29/10/2009

 

   Olá, meu nome é M. e eu sou TJ afastada...

Fui criada como TJ desde que nasci numa cidade do interior do Rio Grande do Sul, minha família é TJ  de longa data...não tive uma outra opção pra escolher a não ser essa...

Nunca gostei de ser uma, sempre queria ir nas festinhas de aniversário e não podia, brincar com as amigas na frente de casa tb não, festas na escola tb não, enfim nada podia, nem mesmo assistir ao desenho Smurfs que passava na tv pela manhã podia..

A Torre contava na tribuna incríveis histórias dos Smurfs que saiam do papel de parede do quarto de criancinhas e que as perturbavam...etc...

Detalhe: minha mãe era batizada e meu pai desassociado (motivo: cigarro).

E eu me sentia meio que na obrigação de ser filha exemplar pra não causar mais desgosto, visto que minha irmã mais nova não queria saber de ser TJ.

Quando fiquei adolescente fiquei mais próxima de amigas TJ, saíamos juntas etc...(ficávamos com meninos, mas nada sério, porém totalmente contra a Torre, né), então, acho que por mais isso que outra coisa me batizei aos 16.

Quando me batizei achei que podia viver pro resto da vida sendo TJ, levando em "banho-maria" e não fazendo nada de "errado".  

Bem, foi quando eu tive meu primeiro insight que nada ficaria bem por muito tempo.

Primeiro, ia no campo quando dava, fazia 4 a 2 horas/mês, super pouco, e ia nas reuniões, quase não faltava.

Segundo: tinha certas coisas que acontecia na crença das TJ que não aceitava, mas não podia falar um 'A' dentro de casa, senão eu seria apóstata.

E, finalmente, aos meus 19 anos, percebi minha orientação sexual... eu era lésbica.  Me sentia atraída completamente por mulheres, e aceitei isso bem, as pessoas não podem jogar pedras umas nas outras por causa disso...sempre pensei assim, mesmo antes de notar qualquer coisa em mim...

Resumindo, aos 26 abandonei totalmente a Torre, pois já estava envolvida com uma mulher de Porto Alegre totalmente, e não tinha mais nada a ver eu ficar lá.  Hoje, com 30 anos, estamos juntas ainda.

Pra minha mãe é o maior desgosto eu não ser mais TJ, mas ela não sabe do meu relacionamento e muito menos que agora, sim, eu sei a verdade sobre a religião das TJ.

Seu site foi excelente pra mim, pois vi coisas que quem está lá dentro não vê, pois está entorpecido demais pra ver isso.

Fatos fortes que me foram mostrados como: TJ e ONU; TJ e a questão do México; será que Russel era um homem tão inspirado por Deus mesmo?  Visto que ele era totalmente patriota, racista, elitista, envolvido com maçonaria, piramidologia e tantos outros...

E por fim, as mensagens subliminares que a Torre coloca nas gravuras, das quais estou ainda perplexa... 

E li todos os depoimentos de pessoas que sofrem até hoje por serem desassociadas e traumatizadas.

O irmão Franz, sim, o considero um irmão porque ele abre os olhos dos que estão cegos ou perdidos como eu, seus livros são ótimos e nos confortam.

Um abraço,

M.

 

 Página em Constante Atualização

 

 

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